quarta-feira, 30 de maio de 2007

Ideologia torcedora

-No último domingo (27/5) umas 13hrs, por conta de alguns compromissos, fui obrigado a utilizar o metrô. Sai da estação Barra Funda e fui sentido Penha (linha vermelha). Quando cheguei na Marechal Deodoro notei alguns gritos vindos de longe, percebi a agitação de todos passageiros quando a torcida Independente (organizada do São Paulo) desceu a escada rolante gritando algo como "Vai toma no c... porco...".

Passado um tempo, depois do susto, todos desceram na estação Sé, e eu comecei a pensar sobre o comportamento daquelas pessoas.


Já cheguei a ouvir uma história, de um membro da Gaviões da Fiel (organizada corintiana), sobre dois irmãos: um corintiano e um santista, que eram obrigados, por regulamento, a se baterem caso se encontrassem na rua. O mais estranho de tudo isso talvez fosse o fato que eles obedeciam a "lei", apesar de se amarem em casa.


O que leva uma pessoa a considerar uma torcida de futebol acima de todas as coisas? Sensação de poder? Amor a violência? Pura ignorância.


O caminho até a Penha foi curto demais pra eu responder.

Rubens Nogueira

segunda-feira, 28 de maio de 2007

RCTV

Na noite de ontem, em Caracas, encerrava-se a última transmissão aberta da RCTV, rede de tv mais antiga e popular da Venezuela. Hugo Chávez já anunciou, dias depois de sua reeleição, em dezembro de 2006, que não renovaria a concessão de freqüência estatal. Às 23:59h o sinal da emissora foi cortado, e, aproximadamente 20 minutos depois, entrava no ar, na mesma freqüência, a TVes ("Te ves", "você se vê" em português), Televisora Venezolana Social, criada pelo governo, com uma programação de "serviço público".
O governo venezuelano acusa a Radio Caracas Televisión (RCTV) de prejudicar o socialismo do século XXI. A emissora apoiou abertamente o golpe sofrido por Chávez, em 2002. O documentário "A revolução não será televisionada", que foi filmado enquanto o golpe ocorria, mostra como algumas imagens foram manipuladas por emissoras privadas, e como o sucesso (temporário) do golpe foi comemorado, no dia seguinte, em programas de opinião.

Achei curiosa a frase de Hugo Chávez, publicada pela Folha Online: "Esse canal fez muitos danos ao país durante muito tempo: os valores negativos, o bombardeio midiático de violência, o ódio, o racismo, o sexo mal visto e mal entendido, o desrespeito à mulher, aos meninos, às meninas, o desrespeito às muitas manifestações da vida social, aos homossexuais, ao país e ao mundo e às pessoas que tem alguma deficiência. Essa é a razão de fundo". Agora pense: maior e mais popular emissora, valores negativos, manipulação de informação. Isso tudo não lembra um outro país sul-americano que conhecemos? Pois é, creio que a única diferença entre Brasil e Venezuela é que lá as coisas aconteceram de maneira mais direta, onde as emissoras tomaram suas posições abertamente, e não apenas escolheram as informações que transmitiriam ao público, sem deixar claro aos telespectadores quando estão defendendo seus valores políticos, e principalmente, econômicos.

Acredito que este fato pode nos fazer discutir sobre alguns temas:

A manipulação de informação pela imprensa - sabemos que é impossível retratarmos um fato com 100% de exatidão, e que, até mesmo sem querer, podemos manipular a informação que será passada. Mas e quando isso é feito propositalmente, e com fins políticos e/ou econômicos, não seria melhor falar disso abertamente? Ou é melhor a "grande imprensa" continuar fingindo que é imparcial, e nós continuarmos fingindo que acreditamos?

Liberdade de imprensa e liberdade de escolha - Quando, claramente, uma emissora se opõe ao governo, até onde vai a real liberdade de imprensa? Existe, no Brasil, alguma empresa onde um jornalista pode realmente fazer o seu trabalho, sem interferência em suas opiniões? E quanto ao direito de escolha? O fechamento da RCTV, na Venezuela, tira do ar novelas populares, e a "Rádio Rochela", programa humorístico mais antigo da tv do país. Se fosse no Brasil, tirar do ar a novela das 20h da Rede Globo acabaria, inclusive, com toda a programação vespertina de outras emissoras. E quem tem a televisão como único meio de informação e diversão? Devem mesmo ver apenas o que o governo quer?

Imagino como o bombardeio de informações (falsas ou não) estava deixando a população venezuelana desnorteada, mas não concordo com a substituição que está sendo feita. Mal feita ou não, a oposição da RCTV era importante, sendo que o governo já dispunha de um outro canal estatal. Quem garante a veracidade das informações transmitidas pelo governo?

Link para o documentário "A revolução não será televisionada": http://www.megaupload.com/?d=J48P75FL

Rodrigo Simões

quinta-feira, 24 de maio de 2007

O prazer através da dor

Na aula do último dia 10, o professor Dimas nos explicou em aula as características dos diferentes movimentos que fizeram parte do Helenismo. Dentre essas características, me chamou atenção um pensamento daqueles que tinham como maior virtude o prazer, os Epicuristas: o de que o prazer ganho através da dor é maior.

Imediatamente me veio à cabeça uma cena do filme Vanilla Sky, em que um personagem diz que "o doce não é tão doce sem o amargo". Ou seja, uma vitória fácil não é tão saborosa quanto aquela que foi conquistada superando dificuldades.

Acredito que grande parte da sociedade atual, senão toda, tenha incorporado este pensamento epicurista (isto se não for algo inerente ao ser humano). Não que sejamos masoquistas e busquemos problemas, mas encarar condições adversas e vencê-las é algo que nos fascina. E aqueles que conquistam suas vitórias, sejam elas quais forem, de forma mais "suada" são mais admirados do que os que tiveram mais facilidade. Como no futebol: ganhar no campo do adversário, de virada e com jogadores expulsos é bem mais celebrado do que uma fácil goleada.

Paulo Gomes

segunda-feira, 21 de maio de 2007

A luta para o bem comum ou individual?

O meio universitário sofreu um grande abalo há cerca de 3 semanas. Os estudantes da Universidade de São Paulo iniciaram uma manifestação contra os decretos do governador José Serra alegando que as medidas adotadas retirariam a autonomia da universidade. Além de reivindicar um posicionamento da reitoria frente à posição do governo, eles pedem melhoras na infra-estrutura e a construção de moradias dentro do campus do Butantã. Para mostrar a força do movimento, eles invadiram o prédio da reitoria e prometeram sair somente quando suas exigências forem atendidas, num protesto que já dura quase um mês inteiro.
Entretanto, apesar de os professores também terem concordado com a greve, apenas uma parcela dos estudantes juntou-se ao movimento. Outros concordam plenamente com a causa e defendem o direito de protesto universitário, mas acham que há formas mais eficazes de conseguir providências. O meio que está sendo utilizado – a greve – prejudica até aqueles que se posicionam contra a causa, pois paralisa todas as atividades de professores e funcionários da instituição. Além disso, o governo já enviou dois avisos aos estudantes. Em último caso, uma intervenção militar poderá ocorrer, causando violência no que deveria ser um protesto pacífico.
A discussão sobre a forma de protesto deveria ser aprofundada. É preciso radicalização sim, pois somente assim o governo cederá à pressão e negociará com os estudantes. Mas outros meios podem mostrar-se melhores e eficientes, como piquetes diários diante do Palácio dos Bandeirantes, passeatas em vias importantes da capital e outras manifestações. Assim, os que não concordam com a causa podem manter suas atividades em dia e os que concordam, lutam por seu sucesso. A greve tem o objetivo se trazer o bem coletivo, mas assim traz apenas o que quer uma pequena parte dos estudantes.


Por João Carioca

Confira aqui o blog da ocupação da reitoria da USP.

terça-feira, 15 de maio de 2007

papa e os índios

Mais uma vez polêmica. Declarações do papa sobre a história indígena não agradou líderes da comunidade. O papa afirma que o catolicismo purificou os índios e que seria um retrocesso retornarem ás suas religiões originais.
Vale debater os conceitos que nos foram ensinados na matéria de antropologia do 1° bimestre. O etnocentrismo ou ainda o etnocídio, pois ficou clara a idéia de que Bento 16 entende a igreja católica como superior ás demais igrejas, crenças e religiões.
E não há exemplo maior do que o etnocídio ocorrido no "descobrimento" do Brasil, as chamadas missões jesuíticas tiveram papel fundamental na conversão indígena. Muitos defendem a idéia de que a conversão ajudou o povo indígena, tentando de todas as formas os proteger dos homens brancos, que os queriam mortos. Mas o que realmente entende-se por mais inescrupuloso? o assassinato do corpo ou o da alma?
O pontífice ainda afirmou que a igreja não havia se imposto aos povos indígenas da América. Segundo ele, os índios receberam bem os padres europeus, pois Cristo era o salvador que eles esperavam silenciosamente.
A má repercussão percorreu o país, e até mesmo membros da igreja se aborreceram com as afirmações.
O líder da tribo Makuxi de Roraima, Dionito José de Souza, indignado não se calou "O estado usou a igreja para fazer o trabalho sujo da colonização dos índios, mas eles já pediram perdão...quer dizer que o papa esta voltando atrás com a palavra da igreja?"
Realmente o papa parece não ter papas na língua e diz o que pensa, ignorando o que a história nos conta.

Por: Amanda Fincatti

segunda-feira, 14 de maio de 2007

Para gerar discussão

No bimestre passado o grupo Foco Filosofia apresentou um seminário sobre a atual situação da Igreja Católica. Demos atenção especial para os ícones católicos e surgiu, durante o debate em sala de aula, uma polêmica interessante sobre a figura do Papa, especialmente, o conservadorismo mostrado nos discursos de Bento XVI.
Nesse sentido, já que, nos últimos dias, estamos acompanhando de perto a visita do chefe supremo da Igreja Católica ao Brasil, seria válido retomar a discussão sobre alguns temas, como o aborto e a eutanásia criticados pelo papa. De certo que suas declarações de nada surpreenderam, já que a Igreja é reconhecidamente contra esses e outros métodos, como pílulas anticoncepcionais e camisinha. A justificativa para tais condenações é sempre a de que a Igreja é acima de tudo a favor da vida.
Em contrapartida às declarações de Bento XVI, relacionamos abaixo alguns argumentos mais concretos sobre as práticas que a Igreja tanto condena: o Aborto e a Eutanásia e a partir desses pontos de vista surge a discussão que gostaríamos de gerar:
Até que ponto o Brasil é um país verdadeiramente laico?

Sobre o aborto:
1º - A mulher que é portadora do embrião tem total liberdade, ou pelo menos deveria ter, para fazer o que bem quisesse com o seu corpo. E já que o embrião só está 'vivo' ligado à mãe, esta deveria ter o direito de escolher se quer ou não portá-lo.
2º - Em casos de estupro, a discussão se torna mais difícil ainda. O filho gerado não é desejado, e se nascer, sofrerá as conseqüências disso, coisa que não deveria acontecer. (O aborto, nesses casos, é muitas das vezes aceito, mas é um processo burocrático demais, o que o torna longo e penoso para a mãe que carrega o feto.)
3º - A queda de criminalidade nos EUA, nos anos 90, está diretamente relacionada à liberação do aborto a partir de 1973, como mostra o livro "Freakonomics". Fato esse que se justifica, já que crianças indesejadas sofrem com a falta de amor e auxílio dos pais, se tornando jovens violentos e com diversos outros problemas.

Sobre métodos contraceptivos:
Tanto a camisinha quanto a pílula anticoncepcional são métodos contraceptivos de grande importância para a sociedade atual. Quando citamos uma sociedade atual estamos falando de uma grande parcela de jovens que têm relações sexuais precocemente, desprovidos de orientação adequada e sujeitos a contraírem uma DST (Doença Sexualmente Transmissível). Junto a esses está a parcela de adultos sem parceiros fixos. Esta realidade vai de encontro com os ideais da Igreja Católica. A camisinha, além de ser um método barato, de fácil aquisição e distribuição por parte do Governo, é também um dos mais eficazes. Se for utilizada corretamente, há a possibilidade de falhar em apenas 2%, e é o único método que une contracepção e proteção de DST’s. Não há como abrir mão de uma questão de saúde pública em prol de uma posição conservadora da instituição católica. Esses fundamentos religiosos se adequavam em uma época que os jovens não tinham tanto contato sexual, que os adultos tinham parceiros para a vida toda e que a promiscuidade era em proporções menores, o que não se parece em nada com o contexto atual.

Sobre a eutanásia:
A eutanásia é a prática pela qual se abrevia, sem dor ou sofrimento, a vida de um enfermo incurável.
Quem argumenta a favor da eutanásia, acredita que esta seja um caminho para evitar a dor e o sofrimento de pessoas em fase terminal ou sem qualidade de vida, um caminho consciente que reflete uma decisão informada.Uma defesa que assume o interesse individual acima da sociedade que, com suas leis e códigos, visa proteger a vida. A eutanásia não defende a morte, diretamente, e sim a opção pela mesma por parte de quem a concebe como melhor opção ou a única.
Por trás dessa escolha, são levados em conta todos os fatores (biológicos, sociais, culturais, econômicos e psíquicos) de forma a assegurar a verdadeira autonomia do indivíduo que, alheio de influências exteriores à sua vontade, certifique a impossibilidade de arrependimento.
Nesse sentido ao condenar ostensivamente a prática da eutanásia, a Igreja Católica impede que os indivíduos sequer pensem nessa hipótese. A dor, o sofrimento e o esgotamento do projeto de vida, são situações que levam as pessoas a desistirem de viver. A questão deveria ser tratada muito mais como livre arbítrio do que como conceitos dogmáticos e generalistas. Se é verdade que a eutanásia abrevia uma privação desnecessária, não seria papel da Igreja deixar essa questão para ser resolvida na indivualidade?
O fato é que a autonomia no direito a morrer não é permitida em detrimento das regras que regem a sociedade,e endossadas por discursos conservadores como os do papa Bento XVI, por outro lado a obrigatoriedade e a submissão às leis prolonga uma situação, que em todos os aspectos acaba por custar um preço elevado, desgastante para quem vive em meio a esse fogo cruzado.

Fernanda Abrão e Natalia Guaratto

domingo, 13 de maio de 2007

Roteiro para leitura

Confesso que ao começar a leitura de A Utopia, livro escrito por Tomás Morus e recomendado pelo professor Dimas, senti certo tédio e quase nenhum interesse. As primeiras vinte e cinco páginas foram lidas com um pouco de custo e desatenção, até que me dei conta da grande obra que estava em minhas mãos. A narrativa de Morus me envolveu e fez com que eu relesse essas primeiras páginas e ainda escrevesse em média a cada dez páginas lidas uma pequena sinopse dos fatos. Os conceitos discutidos no livro são extremamente relevantes, mesmo tendo sido escritos há séculos. Além de importante na área da filosofia, A Utopia nos faz compreender melhor a história e a atualidade das sociedades não só européias como também americanas. A mentalidade daqueles que viveram na época das grandes navegações se mostra bastante homogênea dentro dos textos históricos em geral, no entanto o relato transcrito por Morus revela uma gama de pensamentos diferentes: mais esclarecidos e bastante eloqüentes. Definitivamente uma obra relevante na formação social de qualquer um; nosso grupo da aula de filosofia teve muita sorte ao se deparar com o desafio de transmitir os muitos ensinamentos contidos em A Utopia. Dessa forma tentaremos realizar um seminário coerente e o mais esclarecedor possível. Dito isso, finalizo reforçando minha recomendação e apreço pela obra: leiam, vale a pena!
Por: Daniella Cornachione

sexta-feira, 4 de maio de 2007

Virada Cultural

Neste sábado, 05/05, São Paulo viverá mais uma Virada Cultural. A maratona de 24 horas ininterruptas de atrações está na sua terceira edição, e ocorrerá em um ambiente bem mais tranqüilo que o do ano passado, quando o PCC aterrorizou a cidade uma semana antes do evento.

Das 18h às 18h, vários artistas se revezarão em palcos espalhados pela cidade. O centro contará com 5 grandes palcos temáticos, e cada região de São Paulo com mais um pólo de apresentações. Também participarão os CEU’s, as unidades do Sesc e museus, além dos estabelecimentos que aderirem à maratona.

Música, teatro, circo, cinema... Confira a programação (em PDF):

http://www.viradacultural.com.br/img/viradacultural2007_programacao.pdf

Aproveitem!!!

Rodrigo Simões

FILOSOFIA


Metamorfose Ambulante


Raul Seixas

Composição: RAUL SEIXAS

Prefiro ser essa metamorfose ambulante

Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo


Eu quero dizer agora o oposto do que eu disse antes

Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo


Sobre o que é o amor

Sobre o que eu nem sei quem sou

Se hoje eu sou estrela amanhã já se apagou

Se hoje eu te odeio amanhã lhe tenho amor

Lhe tenho amor

Lhe tenho horror

Lhe faço amor

Eu sou um ator


É chato chegar a um objetivo num instante

Eu quero viver essa metamorfose ambulante

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo


Sobre o que é o amor

Sobre o que eu nem sei quem sou

Hoje eu sou estrela amanhã já se apagou

Se hoje eu te odeio amanhã lhe tenho amor

Lhe tenho amor

Lhe tenho horror

Lhe faço amor

Eu sou um ator


Eu vou lhes dizer aquilo tudo que eu lhes disse antes

Prefiro ser essa metamorfose ambulante

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo

Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo


Ludmilla Pazian

Alegoria da Caverna


Como este foi o tema discutido durante a última aula, achei interessante postar o trecho do livro A República, onde Platão expõe a alegoria. Retirado do livro VII, este é um diálogo entre Sócrates e Glauco, irmão de Platão.




Sócrates - Agora imagina a maneira como segue o estado das nossas naturezas relativamente à instrução e à ignorância. Imagina homens numa moradasubterrânea, em forma de caverna, com uma entrada aberta à luz; esses homensestão aí desde a infância, de perna e pescoço acorrentados, de modo que nãopodem mexer-se nem ver senão o que está diante deles, pois as correntes osimpedem de voltar à cabeça; a luz chega-lhes de uma fogueira acesa numa colina quese ergue por detrás deles; entre o fogo e os prisioneiros passa uma estradaascendente. Imagina que ao longo dessa estrada está construído um pequeno muro,semelhante às divisórias que os apresentadores de títeres armam diante de si epor cima das quais exibem as suas maravilhas.


Glauco - Estou vendo.


Sócrates - Imagina agora, ao longo desse pequeno muro, homens quetransportam objetos de toda espécie, que o transpõem: estatuetas de homens eanimais, de pedra, madeira e toda espécie de matéria; naturalmente, entre essestransportadores, uns falam e outros seguem em silêncio.


Glauco - Um quadro estranho e estranhos prisioneiros.


Sócrates - Assemelham-se a nós. E, para começar, achas que, numa talcondição, eles tenham alguma vez visto, de si mesmos e de seus companheiros,mais do que as sombras projetadas pelo fogo na parede da caverna que lhes ficadefronte?


Glauco - Como, se são obrigados a ficar de cabeça imóvel durante toda avida?


Sócrates - E com as coisas que desfilam? Não se passa o mesmo?


Glauco - Sem dúvida.


Sócrates -Portanto, se pudessem se comunicar uns com os outros, nãoachas que tomariam por objetos reais as sombras que veriam?


Glauco - É bem possível.


Sócrates - E se a parede do fundo da prisão provocasse eco, sempre queum dos transportadores falasse, não julgariam ouvir a sombra que passassediante deles?


Glauco - Sim, por Zeus!


Sócrates - Dessa forma, tais homens não atribuirão realidade senão àssombras dos objetos fabricados?


Glauco - Assim terá de ser.


Sócrates - Considera agora o que lhes acontecerá, naturalmente, se foremlibertados das suas cadeias e curados da sua ignorância. Que se liberte umdesses prisioneiros, que seja ele obrigado a endireitar-se imediatamente, avoltar o pescoço, a caminhar, a erguer os olhos para a luz: ao fazer todosestes movimentos sofrerá, e o deslumbramento impedi-lo-á de distinguir os objetos de que antes via as sombras. Que achas que responderá se alguém lhevier dizer que não viu até então senão fantasmas, mas que agora, mais perto darealidade e voltado para objetos mais reais, vê com mais justeza? Se, enfim,mostrando-lhe cada uma das coisas que passam, o obrigar, à força de perguntas,a dizer o que é? Não achas que ficará embaraçado e que as sombras que viaoutrora lhe parecerão mais verdadeiras do que os objetos que lhe mostram agora?


Glauco - Muito mais verdadeiras.


Sócrates - E se o forçarem a fixar a luz, os seus olhos não ficarãomagoados? Não desviará ele a vista para voltar às coisas que pode fitar e nãoacreditará que estas são realmente mais distintas do que as que se lhe mostram?


Glauco - Com toda a certeza.


Sócrates - E se o arrancarem à força da sua caverna, o obrigarem a subira encosta rude e escarpada e não o largarem antes de o terem arrastado até a luz do Sol, não sofrerá vivamente e não se queixará de tais violências? E, quando tiver chegado à luz, poderá, com os olhos ofuscados pelo seu brilho, distinguir uma só das coisas que ora denominamos verdadeiras?


Glauco - Não o conseguirá, pelo menos de início.


Sócrates - Terá, creio eu, necessidade de se habituar a ver os objetosda região superior. Começará por distinguir mais facilmente as sombras; em seguida, as imagens dos homens e dos outros objetos que se refletem nas águas; por último, os próprios objetos. Depois disso, poderá, enfrentando a claridadedos astros e da Lua, contemplar mais facilmente, durante a noite, os corposcelestes e o próprio céu do que, durante o dia, o Sol e sua luz.


Glauco - Sem dúvida.


Sócrates - Por fim, suponho eu, será o sol, e não as suas imagensrefletidas nas águas ou em qualquer outra coisa, mas o próprio Sol, no seuverdadeiro lugar, que poderá ver e contemplar tal qual é.


Glauco - Necessariamente.


Sócrates - Depois disso, poderá concluir, a respeito do Sol, que é eleque faz as estações e os anos, que governa tudo no mundo visível e que, decerta maneira, é a causa de tudo o que ele via com os seus companheiros, nacaverna.


Glauco - É evidente que chegará a essa conclusão.


Sócrates - Ora, lembrando-se de sua primeira morada, da sabedoria que aíse professa e daqueles que foram seus companheiros de cativeiro, não achas quese alegrará com a mudança e lamentará os que lá ficaram?


Glauco - Sim, com certeza Sócrates.


Sócrates - E se então distribuíssem honras e louvores, se tivessem recompensaspara aquele que se apercebesse, com o olhar mais vivo, da passagem das sombras,que melhor se recordasse das que costumavam chegar em primeiro ou em último lugar, ou virem juntas, e que por isso era o mais hábil em adivinhar a suaaparição, e que provocasse a inveja daqueles que, entre os prisioneiros, são venerados e poderosos? Ou então, como o herói de Homero, não preferirá mil vezes ser um simples lavrador, e sofrer tudo no mundo, a voltar às antigasilusões e viver como vivia?


Glauco - Sou de tua opinião. Preferirá sofrer tudo a ter de viver dessamaneira.


Sócrates - Imagina ainda que esse homem volta à caverna e vai sentar-seno seu antigo lugar: não ficará com os olhos cegos pelas trevas ao se afastarbruscamente da luz do Sol?


Glauco - Por certo que sim.


Sócrates - E se tiver de entrar de novo em competição com osprisioneiros que não se libertaram de suas correntes, para julgar essassombras, estando ainda sua vista confusa e antes que seus olhos se tenhamrecomposto, pois se habituar à escuridão exigirá um tempo bastante longo, nãofará que os outros se riam à sua custa e digam que, tendo ido lá acima, voltoucom a vista estragada, pelo que não vale a pena tentar subir até lá? E sealguém tentar libertar e conduzir para o alto, esse alguém não o mataria, sepudesse fazê-lo?


Glauco - Sem nenhuma dúvida.


Sócrates - Agora, meu caro Glauco, é preciso aplicar, ponto por ponto,esta imagem ao que dissemos atrás e comparar o mundo que nos cerca com a vidada prisão na caverna, e a luz do fogo que a ilumina com a força do Sol. Quanto à subida à região superior e à contemplação dos seus objetos, se a considerarescomo a ascensão da alma para a mansão inteligível, não te enganarás quanto àminha idéia, visto que também tu desejas conhecê-la. Só Deus sabe se ela éverdadeira. Quanto a mim, a minha opinião é esta: no mundo inteligível, a idéiado bem é a última a ser apreendida, e com dificuldade, mas não se podeapreendê-la sem concluir que ela é a causa de tudo o que de reto e belo existem todas as coisas; no mundo visível, ela engendrou a luz; no mundointeligível, é ela que é soberana e dispensa a verdade e a inteligência; e épreciso vê-la para se comportar com sabedoria na vida particular e na vidapública.


Glauco - Concordo com a tua opinião, até onde posso compreendê-la.


Encontrei também um esquema de como seria a caverna. Se encontrar outro desenho melhor, posto depois.






Rodrigo Simões

A Consciência da História: Gadamer e a Hermenêutica


Aproveitando a discussão promovida no mini-seminário sobre a Igreja Católica apresentado em sala de aula, que teve como ponto de partida recentes declarações do Papa Bento XVI, segue um artigo publicado no caderno Mais, da Folha de S. Paulo, em 24.03.02, por ocasião da morte do filósofo alemão Hans-George Gadamer, que influenciou a construção hermenêutica da obra de Leonardo Boff, também abordada no mesmo trabalho em grupo.

A Consciência da História: Gadamer e a Hermenêutica
Ernildo Stein
O filósofo Hans-Georg Gadamer, que ficou conhecido como o autor de "Verdade e Método - Esboços de uma Hermenêutica Filosófica", morreu aos 102 anos de idade, no dia 14 de março, 42 anos após a publicação de sua obra-prima. O subtítulo do livro não agradou ao editor por ser pouco inspirado, teria que ser precedido pelo título propriamente dito: "Compreender e Acontecer". Depois se encontrou o título que faria fortuna, "Verdade e Método" (publicado no Brasil pela editora Vozes).

Durante décadas, a obra concentraria a discussão filosófica na Alemanha: Ela primeiramente foi recebida como uma contraposição às ciências do espírito que interpretaram mal a palavra "compreender" como método. O livro tinha por objetivo apresentar o compreender do intérprete como fazendo parte de um acontecer que decorre do próprio texto que precisa de interpretação.

O que estava em jogo era o fato de que as ciências históricas do espírito tinham estremecido a confiança da filosofia numa razão que perpassa a história. Gadamer tinha compreendido a nova tematização do "tempo" em "Ser e Tempo" (1927), de Heidegger: se o tempo é o horizonte de toda compreensão, todas as teorias devem converter-se inelutavelmente em formações históricas, e isso afetara o núcleo da razão.

Gadamer percebera, pelo seu estudo dos gregos, da filosofia clássica alemã e da fenomenologia, que a tradição não podia mais se apoiar, num sentido filosófico relevante, nas interpretações metafísicas da razão. O diagnóstico da perda da possibilidade de um compromisso possível de nossas orientações fundamentais para a vida numa tal tradição leva Gadamer a introduzir a perspectiva hermenêutica.

Temos assim, segundo v filósofo, para substituir nosso apoio na metafísica, a perspectiva de os próprios participantes se empenharem na apropriação viva de tradições que os determinam. O ser humano esclarecido só tinha, como participante da tradição, uma interpretação das próprias condições históricas que, vindas da tradição, o determinam.

É assim que Gadamer se volta para o trabalho de encontrar o caminho para a consciência histórica, numa apropriação da tradição que preserve para esta a força do compromisso. Esse caminho a hermenêutica filosófica explora na crítica da falsa auto-compreensão metodológica das ciências do espírito. O filósofo pretende salvar a substância da tradição por meio de uma apropriação hermenêutica..

É assim que a filosofia hermenêutica de Gadamer encontra na força civilizatória da tradição a autoridade de uma razão diluída do ponto de vista da história efetiva. Gadamer, portanto, não traz de volta a metafísica nem mesmo uma ontologia salvadora; o que lhe importa é mostrar como a razão deve ser recuperada na historicidade do sentido, e essa tarefa se constitui na auto-compreensão que o ser humano alcança como participante e intérprete da tradição histórica. Se nós formos limitar a indicação dos motivos determinantes que estão presentes num tal estilo de pensamento, poderíamos encontrar as seguintes etapas: o diálogo e a dialética em Platão, a hermenêutica e o diálogo, a arte como paradigma da experiência hermenêutica, o estabelecimento das tarefas de uma hermenêutica filosófica e a universalidade da experiência hermenêutica e, por fim, a aplicação como momento do compreender, a hermenêutica como filosofia prática.

Gadamer afirma, na introdução de seu livro, o seguinte: "As análises que seguem começam (por isso) como uma crítica da experiência estética, para defender a experiência de verdade que nos é dada pela obra de arte, contra a teoria estética que se deixa estreitar pelo conceito de verdade da ciência. As análises, entretanto, não param na justificação da verdade da arte. Elas procuram antes desenvolver, desde esse ponto de partida um conceito de conhecimento e de verdade que corresponde ao todo de nossa experiência hermenêutica. Assim como temos que nos haver, na experiência da arte, com verdades que ultrapassam basicamente a esfera do conhecimento metódico, do mesmo modo algo semelhante vale para o todo das ciências do espírito, nas quais nossa tradição histórica é transformada também em objeto da pesquisa, em todas as suas formas, mas ao mesmo tempo ela mesma passa a falar em sua verdade. A experiência da tradição histórica ultrapassa fundamentalmente aquilo que nela é pesquisável. Ela não apenas é verdadeira e não-verdadeira, no sentido sobre o qual decide a crítica histórica - ela medeia constantemente a verdade na qual importa tomar parte".

Portanto "Verdade e Método" fala-nos de um acontecer da verdade no qual já sempre estamos embarcados pela tradição. Gadamer vê a possibilidade de explicitar fenomenologicamente esse acontecer em três esferas da tradição: o acontecer na obra de arte, o acontecer na história e o acontecer na linguagem. A hermenêutica que cuida dessa verdade não se submete a regras metódicas das ciências humanas, por isso ela é chamada de hermenêutica filosófica. É desse modo que Gadamer inaugura um lugar para a atividade da razão, fora das disciplinas da filosofia clássica e num contexto em que a metafísica foi superada.

Mas, apesar de a hermenêutica filosófica desenvolver-se numa perspectiva crítica da metafísica, ela apresenta uma pretensão de universalidade. Porém tal universalidade assume uma forma não dogmática, restando-lhe, portanto, uma universalidade que se move muito próxima da universalidade da crítica. Jürgen Habermas foi um dos primeiros a serem ' tocados pela pretensão de universalidade da hermenêutica.

Ele reconhece-lhe assim algumas características importantes: a) a hermenêutica é capaz de descrever as estruturas da reconstituição da comunicação perturbada; b) a hermenêutica está necessariamente referida à práxis; c) a hermenêutica destrói a auto-suficiência das ciências do espírito assim como em geral elas se apresentam; d) a hermenêutica tem importância para as ciências sociais, na medida em que demonstra que o do- mínio objetivo delas está pré-estruturado pela tradição e que elas mesmas, bem como o sujeito que compreende, têm seu lugar histórico determinado; e) a consciência hermenêutica atinge, fere e revela os limites da auto-suficiência das ciências naturais, ainda que não possa questionar a metodologia de que elas fazem uso;f) finalmente, hoje uma esfera de interpretação alcançou atualidade social e exige, como nenhuma outra, a consciência hermenêutica, a saber, a tradução de informações científicas relevantes para a linguagem do mundo da vida social.

Ainda que as observações de Habermas reconheçam aspectos da universalidade da hermenêutica filosófica, ele o faz, em contraste, com a pretensão de universalidade da crítica com a qual ele pretende atingir campos onde a hermenêutica filosófica não saberia trabalhar. Não é só por parte de Habermas que se ouvem essas críticas à hermenêutica filosófica, ela também é objeto de crítica da filosofia analítica. Esta vê na historicidade da linguagem e na pré-compreensão como condição de todo- discurso uma falta de recursos para examinar pretensões de validade dos textos que são interpretados ("Tugendhat").

Na medida em que a hermenêutica filosófica trabalha com o sentido, a analítica reduz a linguagem à unidade mínima que é o significado. Mas espíritos mais conciliadores se contentam em afirmar que a hermenêutica sem a filosofia analítica é cega e a filosofia analítica sem a hermenêutica é vazia.

Virada hermenêutica Gadamer nos deu, com sua hermenêutica filosófica, uma lição nova e definitiva: uma coisa é estabelecer uma práxis de interpretação opaca como princípio, e outra coisa bem diferente é inserir a interpretação num contexto - ou de caráter existencial, ou com as características do acontecer da tradição na história do ser - em que interpretar permite ser compreendido progressivamente como uma autocompreensão de quem interpreta. E, de outro lado, a hermenêutica filosófica nos ensina que o ser não pode ser compreendido em sua totalidade, não podendo assim, haver uma pretensão de totalidade da interpretação.

O filósofo produziu realmente uma virada hermenêutica do texto para a auto-compreensão do intérprete que como tal auto-compreensão somente se forma na interpretação, não sendo, portanto, possível descrever o interpretar como produção de um sujeito soberano.

Para encerrar essas considerações, convém ouvir o filósofo falando de sua talvez mais surpreendente afirmação: "Ser que pode ser compreendido é linguagem".

"É assim que sempre me esforcei, de minha parte, para guardar para o espírito o limite imposto a toda experiência hermenêutica do sentido. Quando eu escrevia: 'O ser acessível à compreensão é linguagem', importava ver, nessa fórmula, que o que é não pode jamais ser compreendido em sua totalidade. Em tudo o que uma linguagem desencadeia consigo mesma, ela remete sempre para além do enunciado como tal."

In Mais, caderno especial de Domingo da Folha de São Paulo, 24/03/02.
Thiago Peres

quinta-feira, 3 de maio de 2007

A CORUJA

Não foi à toa a escolha da coruja para ilustrar o blog, tampouco a da frase ao seu lado, de Hegel: “A Coruja de Minerva levanta vôo somente ao entardecer”. Minerva é a deusa romana da sabedoria, equivalente a Atenas na Grécia. Sua mascote é usada para representar a filosofia, pois é uma ave que levanta vôo apenas durante a noite, isto é, quando o que era para acontecer já aconteceu. Assim deve agir o filósofo, analisando e debatendo sobre a história e o presente, sobre fatos concretos. Os cientistas são os que enxergam o futuro. Os pensadores constroem o ideal, que não necessariamente está por vir.

Esta é minha opinião, e creio que irá gerar discussão até mesmo dentro de nosso grupo. Atingiremos, então, nossa meta. O Foco Filosofia é um espaço de debates, sobre qualquer assunto ou fato. Decidimos que cada um irá postar livremente, expondo seus pensamentos, sem apresentação prévia do tema ao grupo. Assim, tentaremos promover o embate de idéias entre nossos integrantes, os outros grupos e os leitores do blog.

Estaremos, assim, fazendo filosofia, e aprendendo a fazer jornalismo. O repórter só chegará o mais próximo possível da realidade comparando e defrontando fontes. As idéias só possuem verdadeiro valor quando debatidas e contrariadas.

“Toda unanimidade é burra” Nélson Rodrigues


Rodrigo Simões

quarta-feira, 2 de maio de 2007

De mudança...

A proposta feita pelo professor Dimas ao iniciarmos o curso foi muito atraente e bem recebida. Afinal, montar um blog em grupo seria algo que além de construtivo, estimularia nossa produção de textos e ainda nos mostraria a importância de um bom convívio interpessoal. Montamos nosso blog com o intuito de participar ativamente, postando bastante e com freqüência, mas não foi exatamente o que aconteceu. Temos nos esforçado para melhorá-lo e admitimos que ainda há muito trabalho a fazer! Justamente devido à vontade de expandir foi que decidimos mudar do uniblog para o blogspot, pois achamos que o segundo oferece mais opções e ainda proporciona uma manutenção mais fácil. Esperamos a compreensão de todos e pedimos desculpas pelo transtorno. Após um bimestre um tanto quanto agitado, fica a motivação e o compromisso de todos os membros do grupo em dedicar mais tempo ao blog. Visto que temos ótimos escritores e pessoas maravilhosas trabalhando juntas para melhorar o espaço virtual – se é que podemos dizer assim – que existe atualmente.

Para que serve a FILOSOFIA

"Você conhece algum filósofo? Ou entende por que uma pessoa escolhe por livre e espontânea vontade ser filósofo? Você sabe qual é o trabalho desse profissional? Onde trabalha? Ou simplesmente a que se propõe?
Para quem não tem a menor idéia dessas respostas e lembra vagamente do filósofo como aquele ser mitológico amante do conhecimento, é bom tomar cuidado. Filósofos modernos existem sim, mas eles andam se escondendo (talvez no fundo de uma caverna de Platão) dentro das universidades, atrás métodos, teorias, histórias e outros assuntos afins. Raramente eles dão as caras para analisar o mundo real, a fonte e a inspiração de seu conhecimento. "Ocorreu uma profissionalização de filosofia para além daquilo que seria necessário, uma especificação muito grande, com uma perda do todo, do real", explica o professor Paulo Ghiraldelli, livre-docente em filosofia pela Unesp (Universidade Estadual Paulista).
Mesmo que você não perceba, está a todo momento pisando em filosofia, seja nos filmes a que assiste, nos livros e jornais que lê e até na televisão. As análises diretas e indiretas de tudo são na verdade um exercício de filosofia, nas quais o conhecimento filosófico ajuda muito. "Não é à toa que a sociedade está buscando esse conhecimento fora da universidade, em cursos livres, debates e livros", acrescenta Ghiraldelli.

PENSAMENTO LIVRE

A filosofia é como uma ferramenta para o pensamento de base. " O filósofo é um livre-pensador que se desapega de seus preconceitos para compreender a realidade na sua diversidade e multiplicidade", explica Ricardo Monteagudo, coordenador no curso de filosofia da Unesp.
Se ainda assim é difícil entender para que serve essa tal filosofia, vale lembrar o quanto da nossa realidade nasceu de estudos filosóficos, por meio de questionamentos de ontologia (da ordem do que existe e porque existe), de lógica (para a organização do discurso, da matemática, do pensamento), sobre o conhecimento (o processo cognitivo e de aprendizado) e sobre a estática (não só do que apreendemos como belo e por que o fazemos, mas também aquilo que
entendemos como arte). A filosofia está à nossa volta.

GRANDES QUESTÕES PARA A FILOSOFIA DO SÉCULO 21

LINGUAGEM: Uma das grandes discussões da filosofia na atualidade é exatamente como conceituar o raciocínio. Do que se compõe a razão? O raciocínio? O pensamento? São perguntas que ficaram cada vez mais difíceis com o avanço da ciência. Nos últimos anos o debate em torno dessas questões trouxe à tona o papel da linguagem para caracterizar o raciocínio. "Nada mais de 'estudo da razão'. Toda discussão da teoria do conhecimento deve ser refeita baseada na linguagem e na comunicação", explica o professor Paulo Ghiraldelli.

ARTE: Parece uma questão irrelevante para a vida prática, mas diz muito a respeito da vida em sociedade. Desde a Antiguidade o mundo se questiona sobre o que, de fato, deve ser considerado arte. A discussão se acirrou com o surgimento, em diferentes momentos, do jornalismo, da fotografia, do cinema, da teledramaturgia, do design e outros. Ao que tudo indica essa confusão ainda deve crescer com novas e cada vez mais freqüentes fusões entre ciência, tecnologia e arte. E você? Sabe dizer o que é arte?

ÉTICA: Afora os problemas éticos que a ciência já está enfrentando na definição do que é a vida, quais os direitos dos animais e como evitar a quebra de privacidade que acompanha a tecnologia, um outro problema a ser pensado pela filosofia é o que é ser justo num mundo multicultural. Sendo a principal pergunta: como agradar ao senso de justiça dos dois? "A questão ética é como criar um código, para além do código liberal, que dê conta dessas nossas divergências sob um mesmo senso de justiça", explica Ghiraldelli."

Texto publicado na revista Galileu, em Agosto de 2005
Colaborou: MARIANE GUSAN